A lua ainda banha a
geada nos telhados quando o galo canta. Seu Albino tira as cobertas e
levanta da cama. Seu 1,95 de altura e quase 100 quilos, cansados pela
idade, exigem um pouco mais de esforço. O termômetro sobre a cômoda
aponta 2 graus. Coloca meias grossas, botas de cano alto, o velho
capotão de lã, boné de feltro, e caminha lentamente para que o
assoalho de madeira da cinquentenária casa não ranja e acorde a
mulher e os filhos.
Na cozinha, abre a
caixa de lenha e as encaixa no fogão. Joga algumas gotas de
querosene na lenha seca, risca um palito de fósforo e logo chamas
vermelhas e amarelas surgem. Pega a chaleira, enche com a água
gelada que sai da torneira e coloca sobre a chapa do fogão. Enquanto
a água esquenta, põe erva na cuia e prepara seu chimarrão. Depois,
senta em frente ao fogão e esquenta as mãos com o calor que começa
a sair. Pela janela da cozinha observa os primeiros raios de sol
banharem o alto do pé de pera que fica logo em frente à casa. “O
dia vai ser frio, mas muito bonito”, pensa.
Minutos depois a
chaleira começa a chiar. Levanta, coloca água na cuia e volta a
sentar para saborear seu café matinal. O calor do fogão agora
aquece toda a cozinha. Sua mulher senta ao seu lado e compartilha
algumas cuias de chimarrão. Os dois conversam sobre o frio, sobre o
dia que começa a nascer. Ele toma mais uma cuia, abre a porta e sai
para alimentar os animais.
O ar gelado da manhã
corta seu rosto e deixa o nariz vermelho. As botas pisam sobre a
geada que ainda cobre a grama do quintal. Sua cachorra perdigueira
deixa a varanda onde dormiu sobre panos cuidadosamente arrumados por
ele na noite anterior, se espreguiça e caminha ao seu lado. Albino
vai ao velho galpão de madeira, pega um balde de ração e leva até
a estrebaria onde está a vaca holandesa batizada de Estrela, devido
a uma estrela branca que tem no pelo negro da testa. Volta ao galpão
e pega outra porção de ração, agora para o porco. As galinhas são
as últimas a serem alimentadas com grãos de milho. Antes de voltar
para o interior da casa, retira os panos que sua mulher colocou sobre
flores e verduras para não serem queimadas pela geada. Todas estão
salvas. Os brotos da parreira também escaparam do frio.
Café
Então ele volta para
casa e encontra mulher e filhos tomando café no calor da cozinha. A
chapa do fogão está tomada por fatias de polenta com queijo
derretido e pedaços de salame, leite quente, café, batata doce, uma
panela com pinhão e outras já com a comida para o almoço. Albino
senta com os filhos, toma seu café reforçado, conversa e depois os
acompanha até o portão para irem à escola. O sol começa a
esquentar a terra e derreter a geada. As crianças correm brincando
para se esquentar.
Ele as observa dobrarem
a esquina e então se dirige para sua ferraria. Seu irmão já está
ao lado da forja quente, tomando chimarrão. Enquanto os dois irmãos
conversam, chegam clientes e amigos que compartilham comentários
sobre a geada e sorvem a água quente do chimarrão.
O frio deixa o ferro da
bigorna queimando as mãos, mas eles estão acostumados. Logo pegam
nos pesados martelos e começam a transformar o ferro em brasa que
sai da forja em ferraduras. As batidas secas de ferro contra ferro
soam como um despertador para a pequena comunidade onde moram.
Postar um comentário
Obrigado por participar...